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quinta-feira, 3 de maio de 2012

POR UM MUNDO MELHOR - POR FELIX CORONEL

E lá se foi meu aniversário... Aniversário para mim sempre foi motivo de reflexão, de intrínsecos pensamentos sobre o que já aconteceu, e o que talvez venha a acontecer, num futuro próximo. Não sei se você notou, mas quando a gente chega a certa idade, começa a pensar sobre o que deixar aos filhos: herança, dinheiro, propriedades, algúm carro velho, sei lá. Ou acaba cogitando seriamente em desfrutar do já adquirido e o mundo que se exploda, incluídos os filhos, netos e demais agregados, porque neste mundão, meu amigo, cada um por si e Deus por todos.

Notei que nas frequentes conversas que tenho com os meus amigos tudo acaba sempre nisso, na mesma pergunta: O que fazer com os filhos? Será que a gente faz essa viagem tão sonhada, compra aquele carro, ou deixa um apartamento quitado para eles desfrutarem? E eu, sempre que me permitem, respondo: Que se explodam. Não me importa. É, talvez até esteja parecendo sádico, mas a cada dia fico mais convencido: “Não me importa nem um pouco”.

Calma, que já lhe explico. Não precisa levar as coisas assim, na ponta da faca... É que eu sempre digo que nasci numa época que não é a minha, veja só. Eu, por exemplo, fiz os meus primeiros anos de escola num colégio de padres, onde ingressei aos três anos de idade. É verdade. Com três aninhos a minha mãe já queria que o filho fosse doutor. Me esforcei tanto nessa escola, mas tanto, que na quinta série consegui ser expulso. Isso é que eu chamo de persistência, saca? Naquela época, quem escrevia errado apanhava com a régua da professora na ponta dos dedos, e nem por isso professor ia em cana, se é que me entende...

Obviamente, muitos dirão que os tempos mudaram. E como mudaram, meudeusdoceumianossinhora!

Naquela época professor ou professora tinha salário digno, que lhe permitia o luxo de ter poucas turmas, e dedicar-se mais a elas. Professor conhecia as famílias de onde provinham seus alunos. E tinha biblioteca. Sim, tinha biblioteca própria. Todos eles tinham, e todos tinham lido todos os livros que estavam na tal de biblioteca. Lembro da minha professora de Biologia e Ciências Sociais, Dona Célica, que foi a primeira que me mostrou onde arrumar aquilo que realmente me interessava. Ela sempre me dizia que dez por cento do que a gente ganha deve gastar em livro, “para não abestalhar-se com o tempo”. Hoje em dia, se eu pedir para um professor torrar dez por cento da miséria que ganha, bem capaz do infeliz ficar sem comer uma semana.

Você deve estar dizendo: mas que absurdo este sujeito! É. Absurdo mesmo. Absurdo porque custa dinheiro colocar um filho na escola, seja esta estadual, gratuita, e o escambau. Custa dinheiro comprar um tênis, um caderno, uma caneta. E dinheiro, como você bem sabe, nem sempre a gente tem. Então, torna-se absurdo não receber uma educação coerente, não acha? Que fique bem claro: não estou contra a classe dos professores, estou contra o sistema. Porque hoje em dia, se correr o bicho pega, e se ficar o bicho come.

Antigamente existia o médico da família, sabe como é? Era o médico que sabia de todos os problemas de cada uma das famílias que ele atendia, e jamais demorava mais do que o tempo necessário para dar o atendimento desejado. Não foi nem uma nem duas vezes que vi minha mãe levar esporro do médico por mimar tanto o seu rebento. Aí não tinha essa de que pelo SUS não dava, que tinha que ser na clínica privada do doutor, e nem tinha diferença entre pobres e ricos. O rico pagava melhor atendimento, é verdade, em grandes clínicas, ou com médicos mais afamados, mas não me lembro de pobre morrendo nos corredores do PS por falta de atendimento. Nem de rico usufruindo do SUS, com tratamento preferencial... Caraca, os tempos mudaram mesmo! A gente levantava do assento quando um idoso ou uma grávida embarcava no ônibus, e todo cara com mais de quarenta era tratado de “senhor”: você uma ova...

Mas, pó, acaba logo, né? Você deve estar dizendo... O que deixar para os filhos? Opa, mudei a pergunta... Que filhos deixamos para o mundo? Meus pais foram e são um modelo para mim. Se preocuparam comigo, me deram a liberdade de ser o que sou, me incentivaram, pagaram meus estudos, me deixaram estudar fora de casa e fazer o tal de intercâmbio cultural no estrangeiro (fundamental, o que me permitiu descobrir que havia outros mundos fora da minha rua, da minha cidade) e dedicaram muito do seu tempo para que eu fosse uma criança feliz. Mas existiam limites, ah! como existiam! Me exigiram muito... Até demais, diria eu, é por isso que sou tão rabugento hoje em dia.

Mas... O que foi que me deixaram? Pois veja bem, eles me deixaram:
- A corrida armamentista (até hoje há 14 ogivas nucleares desaparecidas desde a dissolução da antiga União Soviêtica);
- As ditaduras militares;
- Governos bolivarianos e populistas, como os de Venezuela e Argentina;
- Políticos mamando da teta do Estado por mais de 50 anos...
- O grande e excelente negócio das drogas;
- A camada de ozônio;
- A crise mundial;
- Bósnia, Iugoslávia, Sérvia e Croácia;
- Afeganistão;
- Iraque;
- A corrupção impune;
- A safadeza dentro das Igrejas, qualquer que seja a Bíblia que usem;
- Internet;
- A globalização;
- A fome na África e os estádios de futebol de bilhões;
- A desigualdade social;

E não vou continuar, porque esta lista saiu assim, de uma vez. Se parar e pensar um pouco, acabo escrevendo um livro. Agora eu pergunto: Você acha, por um acaso, que meus pais pensaram no mundo que iam me deixar? Se eles nem sequer podiam imaginar! O que fizeram, e jamais poderei agradecer o suficiente, foi tentar me dar uma boa formação. Se não a obtive, foi tudo culpa minha. Se eu acabei saindo bagual, meio chucro, é minha culpa, porque o esforço, isso sim, eles fizeram.
É isso que quero deixar para minha filha e minha neta, porque se paro para pensar no que vai acontecer no futuro, fico de baixo astral e além do mais, isso não vai prestar, porque não vou ajudar no mais mínimo. Quero que a minha descendência seja gente responsável, sadia, de olhar limpo, pessoas honradas, dignas, que não sejam falastrões, que sejam sinceros, leais, que não mintam descaradamente. O que por aqui e acolá chama-se “gente boa”. Porque se são gente boa farão um mundo bom. Portanto, menos preocupação com os filhos e mais preocupação com a sua formação.

- que saibam diferenciar o certo do errado;
- que não digam que vale tudo, porque não existem regras: há regras sim senhor;
- que pensem nos outros, como eu pensei neles;
- que sejam generosos!
- que respeitem e exijam ser respeitados...

E você pode continuar a lista com as coisas boas que lhe vier nas telhas. Muitas coisas mudaram. Até a Justiça. Agora dizem que há “Humanização da Justiça”. Menor pode roubar, matar, se drogar, mas não pode trabalhar. Eu tive meu primeiro trabalho aos 11 anos, e sem pagamento, que naquela época era “para aprender o ofício”. Leio que uma filha processou seu pai por “abandono afetivo”, alegando ter tido tratamento diferente que os filhos do outro casamento. Família não vêm com Manual de Uso, não é mesmo?

Até a próxima, se Deus quiser.  

Por um mundo melhor
FONTE: Retirado do Site Correio do Litoral: www.correiodolitoral.com


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